Por Douglas de Oliveira
“Os católicos adoram
imagens, sim! Quem já viu se ajoelhar e prestar culto para uma estátua, um
pedaço de barro? Isso é uma blasfêmia!”. A ignorância nossa de cada dia produz
enunciados como o citado anteriormente. Desarmados do conhecimento acerca das
verdadeiras práticas das religiões de outrem e armados das declarações
superficiais que perpassam pelo senso comum, cidadãos de todo o planeta
projetam um pódio imaginário em que se autodenominam vencedores por suas
“crenças superiores” e arremessam seus irmãos humanos à vala etnocêntrica do
menosprezo.
O conceito prévio formado pela cegueira daqueles que não querem enxergar – ou simplesmente, o preconceito – constrói um muro de prepotência, como existiu até a década de 1980 na Irlanda do Norte, que separava meros mortais de comuns mortais, católicos de protestantes, e impedia a busca de um real conhecimento da religião alheia ou a tentativa de compreender e amar o próximo não apenas como outro, mas como a si mesmo. Neste texto, desconstruiremos o mito descrito no título; em postagens posteriores, outras religiões ganharão o mesmo espaço.
Muitos atribuem aos
católicos apostólicos romanos a adoração de imagens. O artigo 2.132 do
Catecismo da Igreja Católica dissolve claramente esse estigma: “O
culto cristão das imagens não é contrário ao primeiro mandamento, que proíbe os
ídolos. Com efeito, ‘a honra prestada a uma imagem remonta ao modelo original’
e ‘quem venera uma imagem venera nela a pessoa representada’. A honra prestada
às santas imagens é uma ‘veneração respeitosa’, e não uma adoração, que só a
Deus se deve [...]”.
Segundo a doutrina do Catolicismo, o próprio
Deus, no Antigo Testamento, “ordenou ou permitiu a instituição de imagens, que
conduziriam simbolicamente à salvação pelo Verbo encarnado: por exemplo, a
serpente de bronze, a arca da Aliança e os querubins” (CIC, 2.130). No entanto,
o Vaticano não defende que os fiéis idolatrem as imagens, assim como condena a
adoração a outras entidades e que criem os ídolos – dinheiro, poder, sexo, raça
–, responsáveis pela escravidão decorrente do vício.
As imagens que adornam as igrejas representam
pessoas importantes na história do Cristianismo, como mártires, e trazem nos
detalhes das vestes ou dos gestos a lembrança de suas ações marcantes e de seus
atributos pessoais. O Jesus crucificado diante dos fiéis, por exemplo,
simboliza a fé no sacrifício para a salvação humana e denota o sentido das
celebrações ali realizadas. A espada na mão do apóstolo Paulo representa sua
morte por decapitação e o livro na outra mão, sua grande influência na escrita
do Novo Testamento.
“Ah, Maria... Quem sabe como foi o rosto de
Maria há mais de dois mil anos? Então sempre tem uma imagem muito bonita, muito
bem feita que, para o católico, reflete aquilo que ela foi. Assim também
podemos pegar uma imagem de um bisavô de alguém. E dizer: ‘olha meu bisavô,
olha como ele era!’. Pra quem não conheceu o Almirante Tamandaré, tem lá o
busto dele... Então a imagem sempre foi para nós o revelar do semblante de uma
pessoa que eu não conheci. E o jeito como olho para aquela imagem traz
admiração, carinho, veneração a alguém digno de honra, gesto diferente de
adorar. Só adoramos mesmo o nosso senhor Jesus Cristo, na Eucaristia”, explica o
padre Rui Braga, da Catedral Basílica de Nossa Senhora das Neves.
Pe. Rui diz ainda que o gesto de se ajoelhar
pode significar um ato penitencial, uma oração ou também uma adoração, a
depender do contexto em ele se dá. Já o terço, instrumento muito utilizado
pelos católicos, carrega consigo um sentido bíblico especial, uma reflexão
acerca dos mistérios da vida de Cristo. Tal significado independe da
materialidade do objeto; há, inclusive, terços eletrônicos. “Rezar o terço é
uma atividade espiritual do católico. A sua religião é uma, a minha é outra.
Daí vem o respeito. O que eu não posso é chegar num culto ecumênico, puxar meu
terço e começar a rezar. Seria um desrespeito muito grande”, complementa pe.
Rui.
Uma das maiores razões para a intolerância
religiosa é o desconhecimento, e as falsas informações que se disseminam com um
valor de verdade em decorrência do condicionamento social. Respeitar é
desprender-se das amarras que nos engessam como estátuas que têm boca e não
falam – ou cospem violência –, têm olhos e não veem – ou enxergam apenas seu
próprio ego.
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